quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Ano Velho, Ano Novo


Mais um ano que passa, mais um ano que começa. Resta-me a sensação de muito que não fiz, apesar de ter dado largos passos em frente na busca incessante pela felicidade. Qual a razão por esta procura que marca a fogo o meu ser? Porque é um estado de espírito que me enche o coração e me liberta a alma! 
Não são os bens materiais ou pequenas futilidades que me fazem sentir realizada mas a felicidade que posso ver no olhar de alguém, o sorriso sincero nos seus lábios e o mundo de afetos que tenho como meu mas que não fecho a ninguém. Adoro espalhar arco-íris e sou tão grata por conseguir chegar a alguém e deixar a minha marca, por insignificante que seja. Gosto de tocar quem se aproxima e cruza o seu caminho com o meu. Sou também tocada e trago comigo todos aqueles com quem um dia me cruzei. Sou uma colecionadora de histórias e sentimentos.
Este ano que finda foi recheado de pessoas boas que jamais esquecerei. Colegas de escola com capacidade de compreenderem o outro e colocarem-se no seu lugar. Colegas com mais experiência, com mais histórias e uma capacidade de partilha incomparável. Colegas com vidas diferentes da minha, com muitas conquistas e muitas desilusões sofridas. Cada um com a sua cruz e o seu modo muito pessoal de a carregar. Uns com mais dificuldades do que outros mas todos empenhados em dar o melhor de si. A escola dos afetos, uma escola para mim.
Mais um ano a terminar e sinto que quero mais. Desejo ser melhor e desejo fazer melhor. Sei que descobrirei um modo de lá chegar, sei que o caminho se faz em frente, passo a passo, com determinação e muita paciência. Sei o que quero e não posso deixar-me perder pela ânsia de chegar mais depressa. Tenho de dar tempo ao tempo e ter fé e foco nas minhas intenções. Possuo um punhado de sonhos para realizar e concretizá-los-ei. Um dia chegarei onde desejo, um dia...
Despeço-me de 2018 com gratidão pelas aprendizagens, pelas amizades, pela partilha de momentos.
Despeço-me de 2018 com gratidão pelos sorrisos que me roubaram e pelas lágrimas que derramei.
Despeço-me de 2018 grata pela família linda que me permite crescer sem limites.
Despeço-me de 2018 grata pelo amor à vida.
Para 2019 desejo manter-me no caminho, com esperança numa sociedade mais solidária e humana. 
Para 2019 desejo multiplicar momentos de felicidade e contagiar outros. 
Para 2019 desejo apreciar os abraços que dou e recebo de quem amo.
Para 2019 desejo ser grata por mais um ano.
E a todos os que fazem parte da minha vida, aos que cruzam o seu caminho com o meu, desejo um oceano tranquilo, um prado verde e florido e um céu azul infinito.
Sejam muito, muito felizes!

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

O meu espírito de Natal


Estamos com o Natal à porta... nesta quadra sinto-me saudosa. Recordo-me da minha meninice, dos meus avós, da minha tia que partiu ainda jovem. O meu coração mirra, sinto-o bem apertadinho pelas saudades dos que já não estão comigo. Mas, se por um lado trago esta tristeza em mim, orgulho-me de tê-los tido na minha vida e de perpetuar a sua existência através de mim. 
Sou apaixonada pela vida e vivo-a intensamente. Vivo uma vida de afetos que preenchem os meus dias esteja onde estiver. Não saberia ser diferente e nem sequer tento. Não tenho medo de dar. Pelo contrário, sinto-me tão bem ao tentar "encontrar" o outro, descobrir o seu mundo e espalhar arco-íris!
As passadas semanas foram difíceis para mim. A frustração do meu filho, perante os resultados escolares que não traduzem o seu esforço por acompanhar um comboio que já partiu há muito, o seu medo das crises noturnas e a minha impotência para inverter os acontecimentos entristeceram-me ao ponto de me fechar no meu mundo. Senti-me só numa luta desigual, contra meio mundo, contra a inércia de toda uma sociedade que fomenta a competição, a desigualdade e cai no exagero, esquecendo-se da miséria humana que se torna nossa vizinha e, aos poucos, se apodera dos nossos corações. 
Foi assim que me senti, só, sem rumo e sem respostas. Foi assim que fui para a escola. Fui mais cedo e fiz o caminho embrenhada numa tristeza que me cortava o peito e sufocava a voz. Verdade, sou transparente. Cheguei e permaneci calada. As minhas colegas aperceberam-se e tentaram animar-me. Mal conseguia responder-lhes. Foi então que a T. disse algo como - "Precisas de um abraço, bem dado, coração com coração! - E eu pensei logo - "Não! Desmoronas já aqui!"- mas não fugi e juntaram-se a Té e a A. Na verdade estava a precisar de um abraço gigantesco! E, coração com coração, fui desarmada e chorei por mim e pelo meu filho nos braços de três colegas. 
Assim é o meu mundo, feito de afetos, sem embaraço em mostrar quem sou ou o que sinto. Sou grata pelo carinho que me dão e gosto de retribuir. Não fecho o meu mundo e sou atraída pelos mundos dos outros. Sou um sistema aberto e dinâmico que interage com quem me rodeia e coleciono, assim, preciosas experiências e recordações. 
Estou numa escola onde me sinto querida e com colegas a quem quero bem. Sou feliz. Tenho alunos que retratam a apatia generalizada pelo ensino mas tenho outros tantos que fazem com que sinta que vale a pena ser professora! E tenho os meus meninos especiais... O D. é um entre outros. Tem síndrome de Down e não queria ir para a sala de aulas. Assustei-me por não saber como lidar com ele mas agora, e com música pelo meio, somos amigos e entra nas minhas aulas com um grande sorriso estampado no rosto. Por alunos como o D. e o meu filho vale a pena ir à luta e superar obstáculos porque a escola é de todos e para todos! Vale a pena cair e erguer-nos de seguida, com aprendizagens feitas e vontade de melhorar redobrada! Vale a pena o embate com cabeças duras, tacanhas e preconceituosas! Vale a pena lutar por um mundo melhor onde a diferença é nossa semelhante!
É com este espírito e com esta vontade que vivo este Natal. A esperança num mundo melhor e onde sejamos verdadeiramente amigos, solidários e a força motriz para que verdadeiras mudanças possam ocorrer nas nossas vidas. Não receiem abrir os vossos corações! Vivam o verdadeiro espírito de Natal! E façam-me o favor de serem FELIZES!



sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Um pequeno milagre


Olhando para trás vislumbro sombras, fragmentos do que fui e não tornarei a ser. Não sou um monte de cacos partidos e colados na tentativa de recuperar o que já fui... simplesmente sou outra pessoa, muito diferente daquilo que alguma vez imaginei. Possuo demónios que, por vezes, me assombram mas nunca os deixo vencer. Apenas lhes permito mostrarem-se para me lembrar como cheguei aqui. Não me assustam pois devido à sua existência sou como sou.
Fazendo uma viagem no tempo quase posso sentir o sabor da descoberta por que tanto ansiava, a rebeldia da juventude e a liberdade com que traçava as linhas do meu futuro. Ai se eu pudesse imaginar o que seria o presente...
Sou muito mais feliz do que fui em algum momento da minha vida, apesar de já me ter considerado o oposto. Carinho, amizade e amor tenho o bastante. Quem me conhece sabe que não minto e não é o que procuro ou anseio neste momento. Considero-me feliz por fazer o que mais gosto! Sou professora e tenho um público que me ouve, que me toca e que consigo tocar. O facto de todos os anos ter uma escola nova tem o seu lado positivo, todos os anos são diferentes, não há monotonia nas minhas relações e enriqueço em experiências e partilha de saberes. Sou um sorvedouro de histórias.
Porém, o tempo passa. Mantenho-me equilibrada... mas falta-me algo. A vida é mesmo assim... ora navegamos águas tranquilas, ora enfrentamos tempestades e, neste momento, atravesso águas turbulentas, sem saber se me espera a serenidade ou o oposto.
Começou tudo em 2007. Temos um longo caminho percorrido e sei que continuamos longe do que desejamos. Por vezes sinto que as forças se vão. Há que parar e tentar encontrar soluções para as necessidades do nosso rapaz. Já arriscámos tanto! Arrepio-me quando recordo os termos de responsabilidade que tivemos de assinar antes das cirurgias. Os riscos, por mais dolorosos que fossem,  assumimos. Tudo pelo bem do nosso filho! 
Apesar de ter melhorado, as crises continuam durante o período de sono. Durante a noite o cérebro do Diogo entra em convulsão e o sono não é reparador. Acorda cansado e no fim de um dia de aulas sente-se exausto. Descobri há poucos dias que algo o preocupa... as crises noturnas e as notas dos testes. Imagino o receio que tem em ir para a cama. Sinto a sua desilusão com os resultados escolares. Não sou indiferente a estes pois sei que o seu bem estar também depende deles mas o que me incomoda é a sua auto estima que sai cada dia mais debilitada. Já lhe expliquei que importantes são as notas no final do ano letivo, até lá terá um caminho a fazer e que irá melhorar. E estaremos cá para ajudá-lo. Mas não é fácil! Dói-me a sua preocupação, dói-me o seu trabalho não ser compensado e o que mais me dói é o seu receio em ter crises durante o sono. Tudo isto se transforma, com o tempo, numa bola de neve. 
A segunda cirurgia foi há cinco anos. Pouco se alterou a condição da epilepsia do nosso filho. Apesar de serem em menor número, as crises não o deixaram em paz. O tempo passou e o Diogo tem noção de que as suas noites de sono não são tranquilas, sabe que faz crises e não gosta. Chegamos, por isso, a mais uma encruzilhada. Os químicos que toma, há mais de cinco anos, podem ser agora novidade para muitos mas não o são para nós. Neste aspeto, o Diogo esteve sempre na linha da frente. Assim, sentimos que há algo mais a fazer e não podemos ficar de braços cruzados. O nosso filho precisa de paz no seu sono! O nosso filho precisa de uma vida sem medos e é isto que me falta - um pequeno milagre para o meu filho!



domingo, 18 de novembro de 2018

À procura de inspiração



Pensei muito antes de escrever. Tenho andado sem vontade de falar, fechei-me mais um pouco. Não é egoísmo. Apenas tento digerir e interiorizar o que me fez sair do trilho para poder voltar a percorrer o meu caminho. Faço-o sempre que experimento algo que me dói. E o que me provoca esta dor, este súbito sentimento de desnorte? Tenho de tomar decisões. Sei bem por onde seguir, sei o que fazer. Porém, também tenho receio de falhar. E este sentimento, que não é novidade para mim, começa a pesar. Talvez seja indício de algum cansaço - "Elas não matam mas moem"!
O ano letivo que decorre começou confuso... a escola inclusiva tão desejada parece-me uma miragem. A inclusão não significa perda de direitos ou substituição de uns por outros. A inclusão significa ser-se aceite com todas as nossas imperfeições e ser-se livre como tal, sem ter de ser confrontado ou apontado e sentir a nossa liberdade diminuída. Não há lugar para a experimentação como de cobaias se tratassem. São miúdos, crianças ou jovens, que de repente perderam apoios que lhes proporcionavam aquisição de competências e aprendizagens, num meio propicio e calmo. Agora estão em salas de aula, sem os apoios de professores de educação especial, alvo de reavaliações que anulam todo o percurso e trabalho feito ao longo de anos. O que me revolta é o desperdício humano, o desperdício de trabalho árduo e vitórias alcançadas com sofrimento e suor. Tudo o que estas crianças e jovens deram para corresponder ao que lhes era solicitado. Todo o empenho e dedicação dos meus colegas que vestiram a camisola da educação especial e deram o seu melhor. Às minhas questões recebo sempre a mesma resposta - vamos aguardar o fim do primeiro período para definir estratégias. Muitas escolas já têm as estratégias bem definidas. Continuaram a implementar os apoios e medidas que eram adequadas aos alunos. Outras retrocederam, sem saber o que faziam, e encontram-se em fase de reavaliação. Outras encontram-se no limbo. E eu pergunto apenas se sabem a importância do tempo para estas crianças e jovens! O retrocesso que este tempo poderá significar nas suas vidas! 
Ando revoltada com tudo isto. Vivo esta trapalhada como mãe e como professora. Faço o melhor que sei e posso mas sei que não é o suficiente. Assim, sei que terei de relativizar. Arregaçar as mangas e seguir em frente na procura de soluções que me apazigúem a alma e me mantenham os pés no chão. 
Abrirei novamente a minha caixinha de música e procurarei na sua melodia a inspiração que senti perdida. 

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Para os teus maravilhosos doze anos


Hoje, pouco depois da meia-noite, cantávamos os teus parabéns... levantaste-te e deste-nos um abraço daqueles que só tu sabes dar. E ali ficámos os quatro unidos pela grandeza dos teus doze anos. O que poderemos desejar neste dia e que se prolongue por toda a tua vida? Sê feliz, muito feliz! O resto virá por acréscimo e tranquilamente. 
Não tenhas pressa em crescer, vive ao teu ritmo e à tua maneira. Não te deixes abater perante as dificuldades pois todos enfrentamos batalhas. Compreende que cada um tem o seu mundo muito próprio e que devemos olhar para os outros sem julgá-los, mesmo que nos julguem a nós. Sê gentil, não percas essa capacidade de dar a mão a quem precisa, sem exigir algo em troca. Os teus abraços são fortes e fazem bem a quem os recebe mas não te esqueças de apreciá-los também. O mundo dos afetos é capaz de grandes milagres.
Nem todos gostam de nós mas não podemos obrigá-los a tal. Não faz mal, meu filho. Importante é respeitarmos a identidade dos outros e sermos respeitados de igual modo. Pensa por ti, não te deixes influenciar pelos outros quando souberes que estás correto. Sê sempre tu mesmo e aproveita o que a vida te oferecer. Oportunidades não faltarão, agarra-as no momento pois o momento é passageiro.
Eu sei que és forte! Porém, ser forte não é usar de força mas é também chorar quando nos magoam, poder fracassar e depois levantar, ter a humildade para pedir ajuda. É percorrer um caminho, nem sempre fácil, e conseguir chegar onde pretendemos de cabeça erguida e de consciência tranquila. As nossas vitórias são agradáveis quando são conquistadas por nós, não quando são devidas a terceiros. 
Nunca percas essa tua capacidade de perdoar pois o verdadeiro amor anda de mãos dadas com o perdão. Quem não perdoa é infeliz e vive acorrentado a sentimentos negativos. Nem todos os dias serão solarengos mas depois de uma tempestade aparecerá sempre o sol radioso e um arco-íris a rasgar o céu azul. 
Pinta a tua vida com as cores que mais gostas e rodeia-te de quem amas. Ninguém te fará mais feliz do que tu próprio. Valoriza-te, estima-te e lembra-te que nunca estarás só. Tens uma família que te ama e que estará sempre presente. 

Parabéns, nosso amor maior! Amo-te daqui até à Lua!

segunda-feira, 7 de maio de 2018

As marcas da Lua


Quem observa a Lua, numa noite limpa, descobre as crateras marcadas na sua superfície pelo impacto de meteoritos. De diferentes dimensões, de diferentes tempos, mas todas visíveis aos olhares curiosos de cada um de nós. Todas as noites olhamos para a mesma face da Lua, aquela que acompanha em sincronia o movimento da Terra e reflete a luz da nossa estrela - o Sol. Sempre gostei de olhá-la, sempre me perdi ao olhá-la, a imaginar como seria a sua face oculta, as marcas que teria de tempos passados.
Tal como o nosso satélite, sou possuidora de marcas que o tempo não apaga. As maiores e mais profundas fazem hoje dez anos. Dez anos...
Foi há dez anos que senti com grande realismo a perda de um filho. Recordo-me, como se fosse hoje. O corpo do Diogo no meu colo, sem qualquer movimento. Os olhos esbugalhados, mas sem vida, sem qualquer tipo de reação à minha voz, ao meu toque no seu rosto. Lembro-me do meu desespero e das minhas súplicas - Meu Deus, não me tires o meu filho! Meu Deus, ajuda-me!
Numa questão de segundos - que se fizeram sentir como uma eternidade - perdi o meu filho e tive-o de volta. Despojada de força, com o coração num compasso brutalmente acelerado, um nó apertado na garganta e totalmente contraída, senti-me perdida e suspensa num pesadelo sem fim. Queria gritar mas as palavras eram mudas. O meu cérebro parecia explodir mas, em simultâneo, mantinha o discernimento claro e em alerta. Não sei como respirava, tal era o turbilhão de emoções que me assaltava e dilacerava o peito.
Esta é a minha maior cratera, aquela que o tempo teima em não apagar. Possuo também uma face oculta que poucos, como eu, conhecem. Sempre a trouxe comigo, mas apenas se manifestou com este impacto avassalador na minha vida. Vislumbro-a sempre que me questiono, sempre que me conheço um pouco melhor. A sua natureza é profunda como as minhas crateras e, se estas me magoaram, o meu lado desconhecido cativou-me e dotou-me de força para enfrentar os desafios e obstáculos, pelo meu filho, pelos meus filhos.
Criei, desde então, um mundo muito meu, no qual tudo é possível - um mundo de afetos - e todos os dias relembro os meus filhos do amor imenso que sinto por eles.
Senti na pele a vulnerabilidade do ser humano. No passado dava tudo como adquirido, era estupidamente feliz e não o sabia. O risco de perder o meu filho nunca se apagou e foi quando me apercebi que também eu morreria. Não imaginava, então, que renasceria naquele dia para o verdadeiro significado da vida. O meu rumo mudou...
Hoje sou grata por mais um ano, amanhã serei grata por mais um dia!

sábado, 28 de abril de 2018

O despertar



Algures, num sarrabisco anterior, escrevia:
"Passei os últimos anos completamente focada no meu filho e na sua epilepsia. As suas necessidades, as suas dificuldades e os obstáculos com que se deparava, tornaram-se o meu principal foco e canalizei todas as minhas energias para a sua orientação e superação. Esqueci-me de MIM! (...) um quase total esquecimento do nosso eu e, subitamente, convertemo-nos em fantasmas - verdadeiras assombrações - que deambulam entre aqueles sonhos suspensos que o tempo decidiu não deixar concretizar. (...) Não posso continuar assim, ...não quero continuar a ser uma mera assombração do meu eu!"
A mudança iniciou-se perante situações adversas que me encurralaram e me fizeram questionar a vida. Foi assim comigo e é assim com todos. 
Certo dia, a Bárbara, o meu "despertador" - assim a apelido há cerca de um ano - perguntou-me o que faria se me dessem apenas vinte e quatro horas de vida... Sinceramente? Senti-me perdida. 
Foram diversas as imagens que invadiram o meu pensamento. Pensei nos meus filhos, nas memórias que guardariam da mãe, na família e nos amigos. Porém, não foram as personagens principais do enredo. Ousaria dizer que não me arrependo de nada ou de ter deixado algo por fazer na construção de memórias boas com todos eles. Passei então para primeiro plano, tornei-me na principal protagonista da minha história. Se deixasse este mundo, esta existência tão breve, qual seria o meu legado? Qual seria a minha marca, o testemunho da minha passagem por esta vida tão fugaz?
Uma pergunta tão simples... uma pergunta que me deixou completamente desnorteada, a mim que já andava sem rumo. Nesta altura, questionava o meu sentido e propósito de vida. Reunia peças de um puzzle, colecionadas ao longo de anos, que ia encaixando, numa tentativa de atribuir alguma ordem ao caos da minha vida. Fui sempre assim, sempre consegui obter respostas a partir de períodos conturbados. Aliás, as maiores descobertas em mim resultaram de períodos confusos e de profunda introspeção. Períodos em que me observo profundamente - mais do que microscopicamente - e embrenho-me nas profundezas do meu subconsciente.
Como descrever o meu subconsciente? Um amontoado de recordações, de aprendizagens que me permitiram evoluir. Um turbilhão de emoções e sentimentos. A minha imaginação pura e as raízes profundas das minhas crenças. Uma teia complexa que rege todos os meus comportamentos. Um lugar escondido que encontrei no recôndito da minha alma e me deixou completamente enfeitiçada. 
O entendimento do meu verdadeiro eu não foi imediato. A cada revelação seguem-se mais uma série de questões, a cada solução seguem-se novos obstáculos... uma introspeção longa e contínua que me tem conduzido por um mundo que conhecia, mas não entendia - EU! 
Sou o resultado de valores transmitidos pela minha família e que estimo em preservar. Sou a manifestação das minhas crenças e de raízes obstinadas que se edificaram profundamente. Sou um todo que se vai revelando lentamente. Reconheço o meu legado e sou a autora da minha história! Deixarei a minha marca... 

segunda-feira, 23 de abril de 2018

Espelhos da alma



Quem me conhece bem diz que sou transparente. Não, os meus olhos são transparentes. Quem os olha verdadeiramente vislumbra os meus sentimentos, as minhas vontades, os meus sonhos e desejos mais profundos. Consegue navegar nas tempestades que os assolam e encontrar consolo no seu sorriso. Por vezes, são cataratas que jorram águas violentas e avassaladoras, num grito mudo. Outras vezes, são raios de um sol luminoso que ofuscam de tão intensos. São o brilho que a Lua reflete num pano negro infinito ou a neblina turva e distante que vagueia entre sonhos desvanecidos. São as portas para a minha alma, ora revigorada e imparável, ora saudosa e introspetiva.
Quem me conhece bem sabe que gosto de olhar nos olhos. Sou incapaz de manter um diálogo sem contacto visual. Procuro nos olhos dos outros as respostas às minhas interrogações. Procuro a sinceridade que tanto aprecio. Procuro a essência, o verdadeiro eu daquele que é ou será, um dia, meu amigo. Gosto de embrenhar-me no olhar dos outros, tentar descobrir as histórias que me contam e conquistar um sorriso cristalino e sincero, doce e colorido como um pirolito.
Para alguns sou desconcertante, para outros sou simplesmente EU! Sou assim... transparente. Quem me olhar nos olhos verá a minha alma, encontrará a fonte da minha inspiração - uma vontade gigante de sonhar e gritar aos sete ventos quão feliz sou eu!

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Gratidão


Depois de um passo decisivo para o meu futuro, algo que me abriu os olhos e permitiu fazer um balanço da minha vida, sinto-me invadida por um tremendo sentimento de gratidão. 
Sinto-me grata por ter cruzado o meu caminho com aqueles que partilharam comigo o passado fim de semana pois são os catalisadores da mudança que já se iniciou.
Sou grata pelos meus filhos - um desafio constante - e pelo meu marido - companheiro e melhor amigo. 
Sinto-me grata pela família linda que tenho, sempre presente, nos bons e maus momentos - um apoio incondicional. 
Sinto-me grata pelas pedras da calçada que me fizeram tropeçar e mudar de direção. Sinto-me grata por ter deparado com obstáculos que me fizeram arregaçar mangas e dar luta à vida, ultrapassar barreiras que julgava intransponíveis e retirar aprendizagens que me enriqueceram como ser humano. 
Sou grata a todos os meus amigos por estarem sempre comigo, presentes ou ausentes. 
Sou grata por cada dia vivido e por toda a beleza que encontro em meu redor. 
Sou grata por poder ver o azul do céu ou as nuvens que o cobrem. 
Sou grata por sentir e por partilhar as emoções que vivencio com quem me rodeia. 
Sou grata por cada lágrima derramada, por cada sorriso, por cada abraço que dou e recebo. 
Sou grata pela vida, pelas pequenas coisas com que me presenteia, pela imensidão de sensações que me percorrem cada poro da pele. 
Sou grata por existir, simplesmente, e poder fazer os outros felizes. Nada me dá mais prazer do que fazer alguém sorrir, mesmo que o seu interior esteja estilhaçado. 
Sou grata por tudo isto e muito mais! 
A vida não é um mar de rosas mas as tempestades não são uma constante. Existem períodos de acalmia que me permitem sonhar e sarrabiscar aquilo que quero... e se és capaz de sonhar, és capaz de realizar. Acredita! 

sábado, 17 de fevereiro de 2018

Amor Eterno


A minha Vida tem seguido por caminhos misteriosos que sempre fomentaram em mim uma enorme curiosidade. Até simples acontecimentos, aparentemente aleatórios, parecem assumir-se como respostas a questões que partilho com poucos, apenas aqueles que se predispõem a ouvir as minhas divagações.
Um dos maiores ensinamentos - que se tem vincado profundamente na minha insignificante existência - é o poder do amor que une aquilo a que damos o nome de Almas. Não duvido, sequer por um instante, da sua grandiosidade e manifestação contínua entre vidas. Por vezes, sinto-me uma simples observadora que se transforma numa contadora de histórias, as histórias daqueles que foram meus no passado e continuam a sê-lo no presente. Sei - pois sinto-o convictamente - esta vida é apenas uma passagem que poderá tornar-se num ciclo de encontros e desencontros entre almas que partilharam, neste plano, o verdadeiro amor. E estes ciclos são feitos de partidas e chegadas, onde a morte e o nascimento se equilibram e o reencontro é protagonizado, sem memória do passado. 
Recordo uma conversa com a minha avó Aida sobre a escolha de nomes para o meu primeiro filho, ainda sem conhecimento do sexo da criança. A única resistência protagonizada pela futura bisa teve como alvo um nome de menina - Carlota, não. Não gosto nada desse nome! Gosto muito de Clara!... - E dava para perceber que aquele nome lhe enchia as medidas, mas nasceu o Diogo e, mais tarde, a nossa Laura, já a minha avó partira.
Os anos passaram e anuncia-se novo nascimento na família, uma menina! Os futuros pais também gostavam muito do nome Carlota mas eu sabia que seria destronado. Tão certo como chamar-me Patrícia - comentava com a tia da criança. - A avó não gostava nada desse nome. Aposto que irá chamar-se Clara!
Sei que as duas conversas ocorreram na ausência dos futuros pais, sei que ninguém influenciou na escolha do nome e sei que nasceu uma Clarinha. Uma menina que representa uma ligação entre duas almas que partilharam um amor verdadeiro que as manterá unidas pela eternidade, seja esta quando for. E fechou-se mais um ciclo, feito de partidas e novas chegadas, sucedendo e regenerando ligações entre almas unidas por um amor imenso, um amor eterno, um amor sem memórias mas vivido intensamente.


segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Epilepsia, conta-me como és.


Hoje comemora-se o Dia Internacional da Epilepsia. Mais um ano... já lá vão dez. Continuamos juntos, ano após ano, numa luta incessante ao preconceito e com esperança num futuro melhor. Deixei de me lamentar há muito pois tenho um filho que tem vencido diferentes obstáculos com muita coragem, nem ele imagina quanta! 
O nosso rapaz vive com a sua epilepsia de um modo indescritível. Fala nela como se nada fosse, gosta de saber se fez crises durante a noite e quantas, não se sente inferior a ninguém e é competitivo e exigente com ele mesmo. Gosta de aprender e ensina muitos a viver. Atira-se de cabeça para a descoberta e não tem receio perante o desconhecido. Se alguns não o aceitam, o rapaz não desarma e transforma-se numa autêntica melga. Já lhe expliquei que não nos devemos impor quando não desejam a nossa companhia e o Diogo responde - Está bem, mãe. Eu vou dar-lhes um tempo. Posso brincar com outros amigos. - E a verdade é que nunca está só, tem sempre um amigo ao seu lado. Sempre ensinamos o nosso filho a conviver com a diferença e a respeitá-la. Dá tudo e tem um sentido de justiça inigualável. 
O Diogo vive com a sua epilepsia desde os vinte e um meses, não conhece - melhor - não tem recordações de outra realidade. A toma da medicação é uma rotina que sempre acompanhou o pequeno almoço e o jantar. Não sente restrições no seu quotidiano e faz uma vida normal. 
Fomos sempre sinceros com o nosso rapaz. Sabe tudo sobre a sua companheira e as dificuldades que a própria provoca no seu desempenho escolar. Sendo um aluno humilde, e reconhecendo as suas dificuldades, pede e aceita ajuda. A epilepsia do Diogo não é desconhecida para ninguém.
Infelizmente, não é assim para todos. Muitos vivem com o receio de terem crises em público, de não serem tratados como iguais, de serem estigmatizados pela sociedade. Muitos contam apenas aos amigos mais próximos e vivem num estado de ansiedade constante, tornando-se pessoas infelizes, vulneráveis e depressivas, e eu questiono-me se não estarão a contribuir para o aumento do preconceito. Afinal, se não nos aceitamos como somos, se não gostamos de quem somos, como poderemos ser felizes? Como poderemos sentir-nos bem com a vida e com os que nos rodeiam? Como poderemos contribuir para um futuro melhor? 
Para nós, como pais, foi muito difícil... mas tudo faremos para que o nosso filho seja feliz. O primeiro passo consiste em aceitar, o segundo passo é não esconder. As feridas curam-se e, por vezes, abrem-se, mas nunca para sempre. As cores de um arco-íris aparecem sempre depois de uma tempestade.
Sejam felizes!