sábado, 16 de abril de 2016

A relatividade do tempo


O tempo é relativo e depende da importância que cada um de nós lhe atribui. Esta aprendizagem custou-me dias, meses sem sono e uma cascata de interrogações que quase me levaram à insanidade. 
A descoberta da sequela que o meu filho herdara da segunda cirurgia foi avassaladora. Eu receava tanto a perda da visão mas o que nos esperava era pior... a Dr.ª Clara bem nos avisara que, entre várias possibilidades, essa seria a mais desejável pois seria uma questão de tempo e adaptação. Agora entendo, com clareza, o que nos pretendia transmitir na altura. 
O Diogo perdeu a consciência fonológica, o que se traduz na perda dos pré-requisitos para a leitura. Parece simples mas, na realidade, é a base para todas as restantes aquisições. Assim sendo, o meu filho ingressou no primeiro ano de escolaridade sem a capacidade de juntar os sons das letras - não conseguia ler - e eu questionava-me sobre o seu futuro. Quantas vezes me torturei pela culpa que sentia em ter desejado a segunda cirurgia... Quantas vezes me torturei por ter sonhado com o que pensava ser para o seu bem.
Nesse mesmo ano letivo concorri para um horário em Massamá, no concelho de Sintra, e tive a oportunidade de conhecer pessoas que marcaram uma fase da minha vida. Passava grande parte do meu tempo na escola e falava muito sobre o Diogo. Não fugi à realidade, pelo contrário, tive tempo para interiorizá-la, aceitar e delinear o caminho a percorrer. Quantas horas de sono roubei à Manuela, ouvinte dos meus desabafos e confidente dos meus receios... um ombro amigo, a minha família em terras de mouros.
O Diogo não fez progressos no decorrer desse ano letivo. O sentimento de impotência era notório nos rostos daqueles que trabalhavam com o meu filho. A professora de educação especial não desistia, a professora titular da turma também não cedia mas eu sabia como era difícil lidar com esta situação. Apesar dos obstáculos, a estimulação neurológica era fundamental para uma possível recuperação que ninguém garantia. O futuro era desconhecido.
Em conversa com a Dr.ª Manuela, questionei se seria possível o cérebro compensar a perda da consciência fonológica com outra área pois parecia-me que a memorização estava mais desenvolvida no meu filho. A resposta foi positiva e a alavanca para novas estratégias a aplicar no ano letivo seguinte. 
No segundo ano, as professoras do Diogo aplicaram o método das 28 palavras e a recuperação foi vislumbrada. O Diogo teve três professoras - a professora da turma, a professora de educação especial e a professora de apoio - que num trabalho árduo e articulado conduziram o meu filho ao sucesso e por tal ser-lhes-ei eternamente grata. As sessões de hipoterapia e terapia da fala foram também dois instrumentos muito importantes para a recuperação do rapaz. 
Foi um ano repleto de vitórias que terminou com sabor amargo e com a minha desformatação.