domingo, 20 de dezembro de 2015

A sequela é descoberta



Há dois anos, por esta altura, entrava em desespero. O Diogo tinha sido operado em setembro, pela segunda vez, e não tinha sofrido nenhuma das sequelas previstas - perda da visão do lado direito, da fala ou perda de mobilidade, apesar de reversível. As crises não cessaram mas manifestavam-se muito mais espaçadas no tempo, cerca de uma a duas crises por mês. Finalmente o meu filho tinha algum descanso e eu também. Mas este descanso era muito superficial e frágil. 
A descoberta da sequela sofrida foi feita no decorrer do primeiro período e confirmada no seu término. O Diogo perdera os pré requisitos da leitura: reconhecia as letras mas estava impossibilitado de juntar os sons, por outras palavras, perdera a consciência fonológica.
Esta notícia foi confirmada pela professora do meu filho e pela terapeuta da fala que o acompanhava desde o início. Aguentei o embate da notícia mas quando me afastei, entrei em desespero. Para adiar o momento em que me encontraria só, em casa, e sabia de antemão que seria penoso, parei no café com esperança de organizar as ideias mas encontrei a Susana. Como já me conhece desde sempre e eu sou transparente, questionou-me e eu desatei num pranto. As lágrimas escorreram-me pelo rosto, contra a minha vontade, e eu mal conseguia falar. Acabei por contar-lhe o que me atormentava a alma.
Mais uma vez, tive que interiorizar uma informação dolorosa que fazia parte do meu processo de aceitação. Mais uma vez, mexiam na ferida e, mais uma vez, tinha que curá-la. Mais uma vez, questionei se o consentimento para a cirurgia fora o mais correto e o melhor para o meu filho. Mais uma vez, questionei o meu Deus...
O futuro do meu filho tornara-se uma incerteza maior. O que fazer para inverter esta sequela que tornaria o seu futuro completamente desconhecido? Falei com a Dr.ª Manuela. Tínhamos que continuar a estimular o Diogo. As reconexões neurológicas seriam novamente estabelecidas mas "o quando" era uma incógnita. Segundo estudos feitos, estas reconexões poderiam demorar anos.
O Natal desse mesmo ano, e estávamos em 2013, foi celebrado com um coração destroçado, impotente, mas com alguma esperança em encontrar uma solução. Já avançara com a terapia da fala, hipoterapia e apoio extra escola, dado pela Armanda, uma grande amiga da família. 
O Diogo, por esta altura, repudiava-me, deixara de me suportar pois eu tornara-me inseparável dele. Como ainda não tinha escola, fazia tudo com ele, de manhã à noite. Eu também não estava a conseguir lidar bem com esta nova situação... acabei por encontrar a solução, penosa mas era uma solução. Em fevereiro de 2014 surgiu um horário em Sintra, mais concretamente em Massamá. A terra não me era desconhecida pois era onde vivia a Manuela, sogra do meu primo Nuno. Falei com o Filipe, com a minha mãe, com o Nuno e, depois de todos me apoiarem nesta decisão, concorri ao horário. Fui colocada.
Por essa altura escrevia o seguinte à Dr.ª Manuela:

Boa noite Dr.ª Manuela.
Já não lhe dava notícias há algum tempo. Como já soube pelo meu marido, estou a dar aulas em Massamá - Lisboa. Era isso ou o desemprego e centenas de colegas a passarem-me à frente, logo o adeus ao ensino. É doloroso, principalmente porque estou afastada dos meus filhos e nunca estive longe deles. Por um lado, penso que vai fazer bem ao Diogo pois ele estava saturado da mãe. Eu andava constantemente com ele para todo o lado, sei que ele vai apreciar esta liberdade e ligar-se a mim de modo diferente. Ele também precisava de espaço. Por outro lado, como estava desempregada, sentia a cada dia que passava uma angústia crescente devido às dificuldades do Diogo na escola. Não havia um segundo em que não pensasse no seu futuro incerto e não me apercebia das suas conquistas, pequenas para uns mas enormes para ele. Se me dói esta distância também é certo que me ajuda a ver as coisas com uma outra perspectiva e a organizar melhor as ideias, dá para entender?(...)


Agora sei que foi o melhor para todos nós! A distância permitiu-me organizar a minha sanidade, ver o problema de outro modo. O Diogo sentiu a minha falta e compreendeu que a mãe só queria o seu bem. Aprendi que afastarmo-nos na altura certa não significa fugir, ao contrário, permite-nos tomar outra consciência dos problemas e encontrar respostas para os mesmos.

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