segunda-feira, 8 de junho de 2015

Compasso de espera



As reuniões de epilepsia realizavam-se todas as primeiras quartas-feiras de cada mês e tínhamos conhecimento de que o caso do Diogo iria ser discutido. Em pouco tempo realizaram-se todos os exames necessários e os resultados eram positivos tornando-o num sério candidato à cirurgia. Para além disso, encontrava-se com 5 anos e entraria para a escola no ano letivo seguinte, sendo a realização da cirurgia preferível antes de tal acontecer. Nestas idades a plasticidade cerebral é muito grande e o cérebro tem uma grande capacidade de readquirir qualquer capacidade que fique prejudicada. Sabíamos tudo isto mas não sabíamos nada para além disso.
A 23 de setembro escrevia à Dr.ª Manuela:

Olá Dr.ª Manuela!
O Diogo já fez os exames em Lisboa. O Dr. Alberto, do Júlio de Matos, acompanhou a RM e no final veio falar connosco. Acho que as notícias são boas pois o foco conseguia ver-se na perfeição, é muito pequeno e encontra-se numa zona mais acima do cérebro do que se julgava. Perguntei ao Dr. Alberto se haveria alguma possibilidade de afetar a visão, ao que respondeu ser muito pouco provável. Pensa que uma única intervenção resolverá o problema do Diogo pois a zona onde se encontra o foco não é das mais problemáticas.
De qualquer modo, dia 12 de Outubro reúnem e dar-lhe-ão notícias. Também nos disse que a próxima ida a Lisboa será para falar com a neurocirurgiã que nos vai explicar a intervenção detalhadamente. Disse-nos o nome mas só me lembro que é de nacionalidade espanhola.
E por agora são só estas as novidades que tenho. O Diogo continua a "fazer das suas" de vez enquando, sempre semelhantes, rigidez dos membros superiores e tremores na perna direita durante uns segundos quando está a dormir.
Sem mais e grata por tudo,
Patrícia

Aguardámos duas semanas e enviei outro e-mail à Dr.ª Manuela a perguntar se sabia algo que nos pudesse adiantar mas a resposta foi a que já contávamos ter, o Diogo irá ser operado mas a lista é grande e teremos de esperar.
Os dias foram passando e as aulas decorriam a um ritmo normal. O Diogo tinha terapia ocupacional duas vezes por semana, uma sessão no infantário e outra nas instalações da Cercifaf com a presença da mãe. As dificuldades eram devidamente diagnosticadas e trabalhadas pela terapeuta Ana que, entretanto, se tornara na “minha Ana” do Diogo. O carinho, a atenção e o modo com que a Ana lidava com o Diogo eram fantásticos. Soubera conhecer e conquistar o rapaz fechado e amuado que lhe chegara às mãos e transformá-lo num menino falador e empenhado nas diferentes tarefas que lhe atribuía. As sessões em que eu estava presente nem sempre decorriam ao mesmo ritmo pois eu parecia mais um elemento castrador ao desempenho do meu rapaz. Não conseguia compreender pacificamente o que acontecia. Sempre me preocupara com o seu bem-estar, só queria o seu bem e ele escondia-me o que sabia fazer. Perdi a conta às vezes em que a Ana ou a Isabel me diziam “O Diogo já sabe fazer isto ou aquilo…”
Certa manhã, mais precisamente na manhã do dia 18 de outubro, terça-feira, levei o Diogo ao infantário e deixei o telemóvel no carro. Quando peguei nele verifiquei que tinha uma chamada do S. Francisco Xavier. “Estranho! O que me quererão?”. Tinha trocado e-mails com a Dr.ª Manuela nesses dias que me assegurara que a cirurgia estaria ainda longe… Fui para a escola certa de que me voltariam a ligar. Todos os intervalos me deixavam um pouco mais apreensiva pois acumulava chamadas não atendidas do hospital. Comecei a ficar desassossegada.
O dia foi passando, aula após aula e chamada após chamada. Cheguei ao ponto de fazer algo que não é de todo prática minha: andar com o telemóvel no bolso em modo vibração. Expliquei aos meus alunos que esperava uma chamada extremamente importante e que, se fosse o caso, teria de atender. Nesse dia tudo pareceu ajudar em sentido contrário. Os miúdos estavam muito agitados e eu empenhada em dar a matéria e sossegá-los. O telemóvel vibrou e eu nem sequer me apercebi de tal. A última aula terminou às 18.25 e dirigi-me ao Centro Novas Oportunidades da escola. Quando lá cheguei comentei com os meus colegas o que se passara durante o dia e como estranhava a insistência. 
Agora era a altura ideal para me ligarem e parece que me ouviram. Logo de seguida atendi a derradeira chamada e reconheci imediatamente a voz que já se tornara tão familiar. “Olá mãe, fala a técnica Ana Rita. Sabe quantas vezes tentei falar consigo?". 

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