Para se obterem bons
resultados num vídeo EEG é necessário filmar o maior número de crises e que
fiquem bem registadas. Para tal a medicação tinha de ser alterada, isto é,
diminuir a quantidade de um dos antiepiléticos e o escolhido foi a lamotrigina.
Vesti o pijama ao Diogo e a Técnica Ana Rita iniciou a tarefa de colar os
imensos elétrodos na cabeça do nosso filho que, entretanto, jogava na sua PSP.
Enquanto isso, eu arrumava as malas no armário e tornava o quarto um pouco mais
nosso decorando-o com os brinquedos e
tecnologia usada pela família.
As horas passaram e
pouco podíamos fazer para além de entreter o Diogo, distraí-lo, pois encontrava-se
preso a uma série de fios que comunicavam com um aparelho, numa sala adjacente,
que registava as suas ondas cerebrais. Neste mesmo aparelho via-se a imagem da
criança, sendo possível observar como ocorriam as crises, obtida por meio de
câmaras instaladas no quarto.
À noite ficava com o Diogo enquanto o Filipe pernoitava num
hotel. Quando me apercebi que o João
Pestana se aproximava, acomodei o meu filho e fiquei alerta. Sabia que iria
ter uma crise ao adormecer pois era o seu ritual quase diário. Poucos minutos
depois, dava um salto do cadeirão em que me instalara, destapava o corpo do
Diogo e carregava num botão onde assinalava a ocorrência da crise. E assim foi
durante duas noites. O número de crises registadas era o suficiente para dar
início ao seu estudo e na quarta-feira teve alta. Antes de regressarmos,
perguntei ao Dr. José Carlos Ferreira se consideraria o Diogo um caso de
cirurgia e a resposta foi positiva. Foi o início de mais uma etapa.
Iniciáramos uma longa
caminhada e os acontecimentos precipitavam-se. Estávamos em agosto de 2011 e, em pleno
feriado, fomos para Vila Praia de Âncora onde gozámos 15 dias de paz e sossego.
Mal chegámos, iniciámos o frenesim de desfazer os sacos, arrumar as roupas e montar
tudo aquilo que distraía as crianças. Estava a colocar a mercearia nos armários
da cozinha quando toca o meu telemóvel… era a Técnica Ana Rita. “Olá mãe. O
Diogo tem uma RM funcional marcada para dia 19 de setembro.” Depois de
confirmar que lá estaríamos, explicou-me que o Diogo deveria ficar em jejum
cerca de 6 horas antes do exame, não podia estar constipado e indicou-nos onde
seria realizado o exame. Depois de apontar todas as indicações, desliguei e
avisei o meu marido.
As férias passaram a correr. As idas à praia eram
muito cansativas. Imaginem duas crianças que adoram água, cada uma a correr
para o seu lado. Um de nós tinha que estar sempre com o Diogo, pois estar
sozinho na água era algo determinantemente proibido, e o outro tinha que
controlar a Laurinha pois a mafarrica atirava-se de cabeça para a água e tinha
apenas ano e meio. À hora de almoço íamos até casa, bastava atravessar a
estrada, dávamos um duche às crianças e fazíamos uma refeição rápida. Seguia-se
a hora da sesta. O Diogo ia até ao quarto com a avó e a Laurinha aterrava no
sofá da sala depois de fazer a habitual birrinha de sono. Aproveitávamos todos
para descansar um pouco, os dias eram desgastantes pois tínhamos dois elétricos
em casa. Quando as tropas despertavam, tomava-se o lanche e voltávamos à praia
para um belo fim de tarde entre construções na areia e umas braçadas na água.
Depois do jantar caminhávamos até ao largo da igreja, sentávamos numa
esplanada onde tomávamos um café e assistíamos a um espetáculo, geralmente de
música. E todos os dias repetíamos esta rotina.
As férias terminaram e
começou mais um ano letivo na escola. Entre reuniões de departamento e de
secção, que se sucediam, delineavam-se as planificações, os critérios
específicos de avaliação dos alunos e conheciam-se os semanários-horários. Eu
continuava a constituir a equipa técnico-pedagógica do Centro Novas Oportunidades
da escola, lecionaria Gestão e Organização dos Serviços e Cuidados de Saúde a
uma turma do curso profissional Técnico Auxiliar de Saúde do 10º ano de
escolaridade, acumulando os cargos de diretora de turma e diretora de curso da
mesma turma, e lecionaria Ciências Naturais a três turmas do 8º ano. Trabalho
não me faltaria, é certo.
Fomos para Lisboa no dia 18, véspera da realização da RM
funcional, com o intuito de ser uma viagem com uma programação especial para o
nosso filho. Não desejávamos que estas viagens se tornassem meras idas ao
hospital, queríamos que o Diogo visse algo diferente em cada uma delas. O
Filipe programou uma ida ao Jardim Zoológico e só depois rumaríamos até
Caselas. Foi um dia bem passado. O Diogo andou de comboio, pouco ou nada
interessado nos animais. Assistimos a um espetáculo de golfinhos e andámos de teleférico.
Penso que foi a distração mais divertida para o nosso filhote pois ria-se da
mãe que petrificara devido ao medo às alturas e só dizia disparates.
Ao fim da
tarde fez a RM. Estiveram presentes mais dois elementos da equipa
multidisciplinar que acompanhava o Diogo: o Dr. Alberto e o Dr. Ricardo Lopes
do hospital Júlio de Matos. Ansiosos pelos resultados, esperámos mais de uma
hora. No fim, o Dr. Alberto aproximou-se de nós e confirmou a visualização e
localização da displasia assegurando que a zona da visão estaria muito perto
mas talvez não ficasse afetada. No dia seguinte voltaríamos a encontrar os dois
profissionais, desta vez para uma avaliação de desempenho que confirmaria o que
já sabíamos.
De regresso a Fafe e de regresso às nossas rotinas diárias.
As aulas começaram e sabíamos que o nome do nosso filho constava na lista de
cirurgia de epilepsia. Sabíamos também que era uma longa lista de anónimos que
já tinham passado pelos mesmos procedimentos e que seria dada prioridade aos
casos mais complicados.
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