quarta-feira, 20 de maio de 2015

Todo o meu ser


Os primeiros meses foram muito complicados pois o Diogo sofria muito com cólicas. Não me lembro de o ouvir chorar como bebé, gritava ao ponto de ficar rouco. Nós, pais pela primeira vez e completamente inexperientes, andávamos desnorteados. Familiares e amigos vinham conhecer o nosso rebento, pouco tempo ficavam mas era sempre o tempo suficiente para ouvirmos “Coitadinho de quem é pequenino e não se sabe queixar!...” e darem sugestões para o acalmar “Faz isto, faz aquilo!...”. Doidos! Foram tempos de enlouquecer, todos opinavam mas ninguém acertava. No dia em que fez três meses, o pesadelo pareceu chegar ao fim pois sossegou e de tal modo que eu, totalmente incrédula, estava sempre a observá-lo, a ver se respirava. Inacreditável! Passara do 8 para o 80. Seguiram-se tempos relativamente tranquilos e finalmente podíamos gozar o nosso filhote.
Aos 14 meses foi para o infantário da Santa Casa da Misericórdia. A fase de adaptação foi um pouco complicada pois todas as manhãs o deixava a chorar. Agarrava-se ao meu pescoço e não me queria soltar, quase me arrancava a roupa do corpo e sentia, todos os dias, que perdia um bocadinho de mim. Eu fazia a minha vida normal e pacata entre a escola e os momentos de contemplação e descoberta diária do meu filho. É tão boa a sensação de que tudo decorre dentro da normalidade… pena é só lhe darmos o devido valor quando a perdemos.
Viria mais tarde a lembrar-me de um cigarro que fumara no jardim e de uma terrível sensação que me acompanhara, um aviso. Existem situações inexplicáveis mas, coincidências ou não, tornaram-se uma realidade muito dura de enfrentar. O meu filho debatia-se com uma epilepsia muito difícil de controlar.
Quando se é mãe pela primeira vez idealizamos uma vida feliz para as nossas crias. Sonhamos com um amanhã solarengo… e este foi-me usurpado repentinamente e de um modo brutal. Todos os meus sonhos foram trancados a sete chaves no recôndito do meu ser. Alienei-me desses mas substitui-os por novos, cujo denominador comum foi e será sempre a felicidade do meu Diogo.
Durante a gravidez li todos os livrinhos sobre maternidade e afins, autênticos manuais de instruções… mas o que fazer quando os nossos filhos não são descritos nos livros? Sempre considerei difícil o papel desempenhado pelos pais e sempre me asseguraram que o vestiria por puro instinto. E é verdade! Assim foi.
O Diogo é uma criança especial. Todos os que trabalham com ele, todos os que o acompanharam e acompanham no seu desenvolvimento, enfim, todos os que o rodeiam, são conquistados e nutrem por ele sentimentos de ternura inexplicáveis. O Diogo é uma criança que não tem maldade no seu coração tornando-se, por isso, docilmente ingénuo. Não suporta ver os outros tristes, detesta injustiças mas é capaz de aceitar a culpa para não prejudicar outros. O meu filho faz o meu coração transbordar de alegria, fez-me aprender que a vida é muito mais do que aquilo que eu idealizava. Hoje sou capaz de apreciar a simplicidade daquilo que me rodeia. Até vislumbrar um simples arco-íris me faz sentir melhor. O meu filho ligou-me à vida, ao que ela tem de mais precioso. Quando respiro, dou graças por poder fazê-lo. E agora pergunto-me “como é possível não amar tanto uma criança?”. O meu filho tem uma epilepsia difícil provocada por uma displasia e depois? Vou descartá-lo como se de um brinquedo defeituoso se tratasse? E não se escandalizem com a frieza da expressão pois vi quem o fizesse… Não! Amo-o ainda mais, com toda a minha vontade, com todo o meu ser!

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